Uma das maiores manifestações de amor, surge da amizade.
Aquela que é verdadeira sabe? Escancarada, explicita. E foi assim com ela, que
no começo tinha tudo pra me odiar, e a recíproca era mais que verdadeira. Mas
sabe de uma coisa?! Amizades que surgem de momentos difíceis, agüentam qualquer
tipo de tempestade como uma casa construída numa rocha.
Eu tinha uns 13 anos ou menos, e ela era tudo que eu odiava
numa menina. Barulhenta, espalhafatosa falando sempre apontando aqueles dedos
tortos, amiga de todo mundo, rebelde sem causa “PORQUE TODO MUNDO ME ODEIA, MEU
PAI ME ODEIA, EU SOU INCOMPREENDIDA BLA BLA BLA”, mimada, SENHOR, COMO ERA (e
ainda é) MIMADA. Eu odeio gente mimada; e gostava de escutar cada coisa que meu
Deus, me causava náuseas.
Eu por outro lado, era defensora da moral e dos bons costumes,
da obediência (QUEM ME VIU, QUEM ME VÊ). Andava de qualquer jeito sem
preocupação nenhuma se a roupa combinava com a bolsa que combinava com o sapato
(na verdade nem bolsa eu usava, saia metendo tudo dentro dos bolsos das calças
cargo femininas que se usavam naquele tempo). TUDO QUE ELA ODEIA. E por uma
marmota do capiroto, fomos parar no mesmo curso.
Mas convivência é uma merda mesmo, ela me odiou mais ainda,
e quando eu pensei que a criatura tinha melhorado, ela piorou. Passou de fingir
que eu não existia, pra soltar bomba em mim mesmo, era ataque massivo. E eu que queria soltar um Pit Bull em cima
dela toda vez que ela usava aquela camisa de teatro mágico, sentia o olhar dela
de quem ia me dar um tiro quando eu usava meias cor de laranja.
Não me perguntem o dia, nem a hora, nem o porquê. Sei que as
duas, meio que ao mesmo tempo, resolveram sair das trincheiras e levantar a
bandeira branca; houve um tempo de guerra fria, em que pequenas aproximações e
descoberta (ou melhor, reafirmação, porque a descoberta já tinha acontecido, a
gente só não admitia) de coisas legais em comum se mesclavam com pequenos
toques de acidez.
Então eis que a guerra fria acaba, só “senti firmeza na
brogadem” quando ela ficou em casa por longos dias sem poder sair, toda
enfaixada usando camisola sem mal poder mexer os braços (porque gente, quem não
tem seus momentos de Michael Jackson na vida não é mesmo?! ) e eu fiquei o
tempo todo lá.
Foi ai que as duas viram que quando o sapato apertava, uma
podia correr pra outra, e chorar, e se lamentar, que a outra sempre iria ter a
palavra certa de consolo “QUEM MANDOU SER GORDA? CÊ PENSA QUE GORDO PASSA NA
PORTA DO CÉU? PASSA NÃO VIU!?”. Foi ai que a gente descobriu, que uma estaria
disposta a ajudar a outra o tempo todo “MULHER TU É ANALFABETA OU O QUE?” “QUE
MERDA É ESSA QUE VOCÊ TÁ VESTINDO?” “USE ESSE SALTO E CAIA NO MEIO DA RUA QUE
EU DEIXO VOCÊ CAIDA E AINDA VOU RIR DOS SEUS DENTES QUEBRADOS”.
E foram muitos dias de ligações durante a madrugada pra
chorar as mágoas pra outra, de histórias longas inacabáveis eternas que eu
contava e ela sempre dormia na metade, de filmes que eu assisti só porque ela
também dormia na metade, de voltar das festas e praticamente cair da cama
porque ela ocupa muito mais da metade do espaço da cama.
E meus pais a adotaram, e os pais dela me adotaram, nutrimos
a mesma falta de amor pelos irmãos e irmãs chatas (temos muitos) e a mesma
mania de falar alto.
Eu ainda odeio o fato de gostar de trancar todas as portas,
e ela deixar todas abertas, odeio ela me cutucando com aquele dedo torto
horroroso enquanto fala comigo, odeio simple plan, loser manos, teatro mágico e
essas viadagens que ela adora.
Mas ela me agüenta cantando Zezé di Camargo e Luciano,
escutando brega, ela suporta minha negligência com os mil convites que ela me
faz e eu esqueço de mais da metade, ela agüenta a minha falta de atenção com os
aniversários, natais, páscoas, que ela faz questão de fazer mil festas e
planejar mil coisas e cortar mil convites enquanto eu não dou a mínima
importância. Até porque tenho preguiça de fazer cartas e coisas minuciosas, não
sou nada perfeccionista. E acreditem, só estou escrevendo isso, porque não
estou com um pingo de sono, minha internet caiu, e eu cochilei e sonhei que ela
era o Dumbo de verdade e chegava voando em um show meu.
Ela prepara cartas e presentes bem elaborados pra mim, eu
cozinho pra ela quando ela ta com fome (ou seja quase sempre, toda hora, todo
minuto) e cuido dela (pfffffff) quando ela fica só em casa sobrevivendo de
MIOJO.
Ela vai a todos os meus shows, opina, grita, chora,
esculhamba, não bebe pra cuidar de mim e rir das merdas que eu faço (E OLHE QUE
SÃO MUITAS) e sempre que uma precisa, a outra aparece com a esculhambação mais
apropriada pro momento.
Sabe como eu sei que é amizade de verdade? Não tem falsidade
de “ai amiga você ta linda, magra, seu cabelo ta lindo, sua make, ai comprou
esse sapato onde?” com ela é chamando de gorda, encalhada, uma fala mal do
cabelo da outra, da roupa, da vida (claro que a gente se elogia, mas quando sua
amiga compra uma tiara nova, a maneira mais fácil de dizer que você notou, é
falando da orelha de abano dela que ficou mais visível)
E eu sei que quando eu casar, ela vai estar lá, chorando e
comendo todos os doces segurando uma placa gigante com a frase “MINHA AMIGA
DESENCALHOU, PFV MT FELIZ AHAZZOU MIGS” e eu vou fazer a mesma coisa no
casamento dela.
Eu sei que um dia, uma das duas vai ter um filho e a outra
vai sair gritando “MEU DEUS COITADA DA CRIANÇA Ó A MÃE QUE ARRUMOU, VEMK MORAR
COM A TITIA QUE EU SOU MT MAIS LEGAL” . E vai ser assim...pra vida toda.
Eu sou uma amiga meia boca as vezes, eu sei Adelis (ou Gi,
ou Gorda, ou Dumbo) mas sei que você me perdoa porque você não vive sem mim e
me ama pra sempre amém. Hauhahuuhauhauhauhauhauh.
Você já inspirou alguns poemas aqui no blog (graças as suas
burrices de amor), mas esse texto é diferente. Ia ser uma carta de feliz
aniversário, que eu , é claro, esqueci de fazer, então feliz aniversário
atrasado, sua gorda. Te amo. ADELIS EU ESCOLHO VOCÊ, POKÉBOLA VAAAAI!!.
kamilatavares.
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